segunda-feira, 10 de maio de 2010

Parte V - Vila Anastácio

Seu amigo João Português morava a 30 metros do cinema. No fundo de sua casa havia um galinheiro. Mojica e seus amigos viviam por lá brincando e ensaiando teatrinhos. Usavam espadas de madeiras e máscaras do Zorro. Eram horas e horas que passavam se divertindo, com fantasias feitas de cartolina e tecido. Mas o que Mojica gostava mesmo, era de vestir a fantasia de vampiro, com longas unhas e dentes feitos de papelão.
Aos 11 anos, o menino ganhou uma surpresa do pai, uma máquina fotográfica. Não pensou muito, e já queria fazer arte com o presente. Logo começou a produzir uma espécie de cineminha de terror, inspirado no famoso “Bat-sinal” de Batman. Muito criativo Mojica tirava dezenas de fotos em preto e branco, depois as revelava e em seguida já pegava os negativos para colar na boca de uma lanterna. Projetava todas as imagens numa parede branca. Às vezes seu pai deixava que projetasse as imagens na telona do cinema.
Depois de se divertir por um tempo com a máquina que ganhou do pai, Mojica queria mais ação. Seu próximo sonho de consumo seria uma câmera 8 milímetros. Insistiu tanto para o pai que acabou ganhando de presente de aniversário ao completar 12 anos.
Os primeiros experimentos com o presente tão desejado foi filmar as redondezas do bairro. Seus amigos sempre o acompanhavam, divertiam-se o dia todo, Mojica já não parava mais em casa.
Eles conseguiram um projetor emprestado e exibiram seus primeiros filmes caseiros num lençol estendido no varal. A cena que mais encantou Mojica foi quando ele viu a fachada do Cine Santos Estevão, esse foi o dia mais feliz.
Durante três anos utilizando a mesma câmera, as experiências tornaram-se mais abrangentes. A turma não se preocupava com roteiro ou continuidade, mas haviam começado a filmar perseguições e brigas. Mojica era o mais astuto do grupo, logo, descobriu alguns conceitos elementares de montagem. Percebeu que poderia relacionar sequencias de ação no próprio equipamento, bastava filmar as cenas em ordem e trocar sempre o ângulo de visão. Tudo isso, sem dispor do de um sistema de edição adequado.
As ideias produzidas pelo grupo eram alternativas. O material deles que pode ser considerado o primeiro experimento a merecer o nome de “filme”, contendo um enredo de começo, meio e fim, foi o curta-metragem O Juízo Final, filmado no ano de 1949. Mojica tinha seus 13 anos apenas.
Com o passar do tempo, Mojica ficou mais exigente. A câmera de 8 milímetros já não estava dando conta de tantas filmagens, o negativo dela era muito pequeno. Ele conversou com os amigos e resolveram fazer uma “vaquinha” para comprar uma máquina de 16 milímetros. Todos concordaram com a ideia. Em 1952 foram até uma loja do centro da cidade e adquiriram a câmera Cinclox, era movida a corda e com apenas uma lente.
Mesmo com a nova câmera, Mojica queria muito mais. Agora a turma precisaria de um espaço para fazer as filmagens. Pensaram então em utilizar o galinheiro da casa de João Português. O local era espaçoso e escondido. O único impasse era que, em todas as filmagens apareceriam galinhas, mais ou menos, umas 50 galinhas.

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